segunda-feira, 19 de abril de 2010

Milan Kundera e a condição humana


A insustentável Leveza do Ser - Romance (1984)


O cerne da filosofia universal teve seus primórdios nas terras gregas, lar de pensadores até hoje lembrados e estudados ao extremo, seja por suas descobertas como, principalmente, por suas dúvidas. Uma das discussões clássicas, primeiramente abordada por Parmênides no século VI a.C., foi a dualidade das coisas. A duplicidade dos elementos existente para o equilíbrio do universo – e, por que não, além dele. Infinitas são as exemplificações, o bem e o mal, o claro e o escuro, o dia e a noite, o Yin e o Yang, todos classificados como o lado positivo e o lado negativo para o fechamento do ciclo. Entretanto, a quase incontestável classificação de cada um gera dúvidas as quais servirão de tronco para o complexo romance A Insustentável Leveza do Ser do tcheco Milan Kundera.

Se podemos facilmente separar cada coisa entre positivo e negativo, então onde entram o peso e a leveza? Kundera, a partir dessa questão, narra a história de quatro protagonistas – dificilmente tomar algum como principal, visto a habilidade do autor em abordar cada um com suma importância - como exemplos para sua análise dicotômica. O romance é dotado de uma ternura complexa. Seus personagens são postos a prova diante de seus romances, traições e vertiginosa vontade de viver. Graças aos seus sonhos humanos de buscar a felicidade, são levados a expor-se com fim de evitar conseqüências terríveis como depressão e até insanidade.

Kundera é genial na sua construção crítica. Não reluta em expor a origem ficcional de suas crias, nascidas de devaneios alheios que, com o devido trabalho, tornaram-se vítimas dos próprios desejos. A seu bel prazer desenvolve episódios onde a opinião do leitor é encarada como parte da análise. Num dos últimos momentos do livro, onde o casal protagonista e seu inseparável cãozinho vivem momentos de união familiar, Kundera lembra nosso desenvolvimento cultural em volta do bichinho de estimação – elemento muito presente e carismático da obra. O discurso que o autor prega sobre o sentimento com um vira-lata moribundo em comparação com um humano em condições precárias é grave, repulsivo e invejável.

O discurso presente não deixa de ser opinião. E, assim como todos os casos, gostos e opiniões divergem. Portanto, a convergência com o autor é avaliada nas prioridades do leitor e no quanto se deixa levar pelos irremediavelmente apaixonados do livro. Todos são vítimas, mas tornaram-se assim pelos atos, desejos e a eterna fuga errante do negativo e a busca do positivo.

"O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (pois isso
se aplica a todas as mulheres) e sim pelo desejo do sono compartilhado (isso se
aplica a uma só mulher)."

2 comentários:

  1. Para Parmênides a leveza é o positivo e o pesado o negativo, "a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, fá-lo voar, afastar-se da terra, do ser terrestre, torna-o semi-real e os seus movimentos tão livres quanto insignificantes".
    Por outro lado, Beethoven considera o peso, assim como a necessidade e o valor, o lado positivo: "a grandeza de um homem reside no fato de carregar o seu destino como Atlas carregava aos ombros a abóbada dos céus."


    Que escolher, então? O peso ou a leveza?

    Ainda não encontrei contradição mais ambígua que essa.

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  2. Tremendamente falastrão me fasso pressente.
    Dani, a ambiguidade é um charme tão sensual quanto delicioso!
    DB, o gosto amargo das manhãs se faz doce, será isso amor?

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