terça-feira, 17 de agosto de 2010

O quarto úmido numa rua escura de Moscou



Ler Dostoievski é, antes de tudo, ser Dostoievski.


É impossível, ao longo das problemáticas e suposições em seus textos, não se transportar para um quarto mal iluminado, com uma calefação nociva afundado em um mar de edificações de uma Rússia gélida, seca e depressiva. Mais precisamente, nos transportamos para uma escrivaninha, madeira de lei, onde o autor deve ter passado longas horas datilografando nas pesadas tecladas de sua máquina de escrever seus mais profundos pensamentos. Como a narrativa presente na primeira parte de Notas do Subsolo, onde o protagonista reflete, com um prazer quase masoquista, as intempéries e os deleites que personificam com clareza, visto o leitor acostumado com suas complexidades, o pensamento da sociedade na época em voga das escritas.


A narrativa extremamente pessoal que obriga protagonista-narrador a revelar segredos muito escondidos torna o romance expansivo. Expansivo porque ao longo de suas crises e desejos, os personagens impõem-se como seres gerais, abordam em suas personalidades as grandes problemáticas da sociedade, seja ela contemporânea do autor ou após.

A expansão norteia-se também pelo filosófico, onde suas criações reclamam pensamentos existencialistas ao mesmo tempo em que lutam para saber se o que dana suas vidas é o ambiente em que vivem ou elas mesmas.


Ao fim da leitura, visto uma experiência árdua ou não, retorna-se ao cenário real, no canto que for do mundo, porém, esse chão não mais será como antes. Imprime-se uma atenção ao fato de que mesmo em um lugar de condições climáticas adversas ao do norte europeu, o resultado na cabeça de quem lê é o mesmo, estar dentro de uma sociedade com seus problemas e com pessoas lutando para sobreviverem sãs. De qualquer forma, é adicionado um aprendizado sobre onde procurar um escape de tal pressão, e também onde não procurar. Pois frieza e insensibilidade não advêm exclusivamente do clima, advêm também das próprias pessoas.

domingo, 8 de agosto de 2010

o circo sem fogo



Já não há mais lugar certo para correr, os bons profissionais estão beirando ou o aposento ou a morte. Os Carlos Lacerdas, José Saramagos, Vladimir Herzogs e Cia., já não exercem mais. Esses tantos - ou escassos -, independente de serem justos ou ditadores, embarcavam em palavras e opiniões que tornavam seu pescoço valioso alvo de quem suas opiniões eram voltadas.Em nosso país, vigora em grande escala a opinião formada, a opinião forte. Entretanto, o real motivo disso tudo é a circulação de fatos sem grande alarde. Onde foram parar os opositores, os embates, o estrume no ventilador, os que gritam e os que ficam calados?

Aquilo que fazem hoje não é negar os fatos, é negar os pensamentos que postos em uso danificariam o fazer jornal como processo setorial, como tarefa industrial, temem pela fraqueza de serem descobertos parciais. Pois é essa parcialidade que fará os chefes demiti-los, as autoridades prendê-los, os cães caçá-los. Seus acusadores, enquanto os amordaçam e os contradizem, esbravejam denominações das mais diversas. Comunistas, fascistas, terroristas, hereges, hipócritas, insanos, criminosos, em suma, tudo o que pode torná-los um perigo aos olhos da população sadia.

A relevância disso tudo é refletir sobre o destino do que antes era uma alternativa de transformação, onde, mesmo lesada, vez ou outra no meio do fogo cruzado, a população se beneficiava de revelações e de uma certa noção de moral, ou da falta dela. As novidades no modo de noticiar, muito além do clássico tablóide matinal, não são desculpa para alegorizar um espaço de escrita que foi fonte teórica para muitas práticas em anos findados.

Alguns falam demais, poucos estão preparados para o momento. E o grande porém disso tudo não é terem medo de ver o circo pegar fogo, isso eles viram ser feito pelos antecessores e enchem os olhos quando rememoram tais episódios. O temor maior é de que, quando os acusados estiverem sendo apontados, eles estejam ainda com suas tochas em mãos.